Desejando mostrar ao filho de oito anos a realidade em que vivem as pessoas simples do interior, um homem muito rico leva o menino a várias residências de agricultores que produzem para subsistência. Casas de madeira sem pintura, galpões com estrebarias e chiqueiros, açudes, potreiros, pomares, vacas, galinhas, marrecos, patos, cavalos e cachorros constituem cenário comum de quase todas as moradias por onde passam.
Gustavo convence o pai de que devem pernoitar numa casinha daquelas, pois havia gostado muito das crianças dali. O pai não quer tal aventura, mas, afinal, pensa ele, isso seria bom para que o filho sinta como é ruim a vida de pobre, e passe a valorizar a vida de fartura que leva na cidade.
À noite, enquanto a esposa do agricultor prepara um jantar simples, o pai do menino rico conversa sem jeito com o dono da casa. Lá fora, em um vasto gramado iluminado pelo luar, sem saber que é rico, Gustavo brinca feliz com as três crianças da casa. Só entram para tomar banho e jantar depois de muita insistência dos pais.
No quartinho onde improvisaram no assoalho uma cama para o menino visitante, as quatro crianças só se aquietam após a meia noite, isso depois de várias intervenções dos donos da casa e até do pai de Gustavo.
Bem cedinho, a ordenha das vacas, o milho para as galinhas, patos e marrecos no terreiro, ração para os porcos, tudo com a ajuda entusiasmada de Gustavo. Depois o café da manhã com leite fresco, ovos que as crianças colheram dos ninhos, pão feito em forno de barro e outras iguarias que o menino da cidade nunca havia provado.
O pai de Gustavo decide que é hora de voltar. Em coro, as crianças da casa pedem que o novo amigo fique pelo menos para o almoço. E não seriam atendidas não fosse o caçula, de três anos, irromper em choro implorando à mãe que falasse com o pai de Gustavo para deixá-lo ficar.
A volta para a cidade se dá só à noitinha, depois que todos comem os lambaris fritos que as crianças pescaram no riacho. Não que Gustavo quisesse voltar tão cedo; só concorda com o retorno depois de intensa negociação com o pai, que promete retornar ao local com o menino e a mãe nas férias escolares, para ficar mais tempo.
Na despedida, Gustavo quer passar seus contatos eletrônicos para os novos amigos. Desiste dessa fidalguia, no entanto, quando o pai explica que naquela casa não há internet.
Durante a viagem de volta, o pai milionário pergunta ao filho:
- O que achou do passeio?
- Legal demais, pai.
- Mas você observou como é triste ser pobre e como é bom ser rico?
- Sim, deve ser tão boa a vida daquelas crianças da colônia. Gostaria de estar no lugar delas.
Perplexo, o pai replica:
- Como, meu filho, você está brincando?!
- Não, pai. Veja só: enquanto na nossa casa só tem uma piscina de dez metros, na deles tem um rio imenso, e ainda cheio de peixes. Enquanto possuímos meia dúzia de árvores no quintal, na casa deles há uma floresta, cheia de pássaros. E são donos da lua e das estrelas, dá para brincar a noite toda no gramado... Só tenho alguns cavalinhos de brinquedo; eles têm cavalos, vacas e um montão de outros bichos, tudo de verdade!
E assim vai a conversa, até que chegam em casa. Mal o carro para, Gustavo salta correndo em direção à mãe, aos gritos:
- Mãe, mãe, hoje conheci umas crianças muito ricas, quero ser igual a elas.
Os conceitos de riqueza e pobreza deveriam ser exatamente como entende Gustavo. Riqueza de verdade deveria significar a oportunidade de encontrar prazer nas coisas simples. Pobreza, o apego às coisas materiais.
Por Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)