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Barreiras do conforto (II). Por Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)
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Publicado em 09/12/2023

Curioso é que as barreiras que impedem nosso crescimento são sempre coisas boas, confortáveis. No meu tempo de estudante secundarista, vi um colega inteligente desistir de estudar porque tinha uma linda motocicleta. Só existiam três delas na cidade. Com a moto ele arranjava namoradas e precisava passear com elas no horário da aula. Todo o colégio o invejava. E o feliz motoqueiro percebia isso. Que vida boa! Mas foi exatamente essa a sua barreira. Outro dia o encontrei muito pobre, separado da família, ainda sem concluir o ensino médio. E sem a motocicleta.

         Um jovem rico perguntou para Jesus o que deveria fazer para conseguir a vida eterna. O Mestre sugeriu-lhe que guardasse os mandamentos sagrados. Quando o rapaz explicou que já fazia isso desde criança, o Mestre continuou:

         - Então vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me.

         Com profunda tristeza, o moço então retira-se de perto de Jesus, preferindo o conforto que lhe proporcionavam os bens materiais (Mt 19.16).

         Nesse episódio é importante observar dois detalhes: 1°) ao retirar-se de perto de Jesus, o jovem demonstra ter trocado a companhia do Mestre pela do dinheiro. Com isso, passa a não mais poder contar com a segurança de estar sempre perto de Deus; 2°) sente tristeza ao distanciar-se de Jesus, pois fazia isso contra a sua vontade. O que queria mesmo era seguir o Mestre, mas, na condição de escravo dos bens materiais, não teve forças para fazê-lo.

         E se esse jovem tivesse seguido o conselho de Jesus? Não tenho dúvida de que seria no mínimo o décimo terceiro discípulo de Cristo, talvez o mais famoso deles, até porque se presume que os doze, por não terem capital, fizeram menor esforço para seguir o Mestre. Se o jovem rico tivesse ouvido Jesus, hoje saberíamos o seu nome. E sua história estaria indelevelmente registrada em milhões de livros, em canções, poesias e pinturas. Seus grandes feitos em prol da transformação do mundo seriam hoje conhecidos por bilhões de pessoas e serviriam como fonte de inspiração para a busca de realização de grandes sonhos.

         Mas ele não teve forças para transpor a barreira gostosa e confortável de sua riqueza, experimentando ali mesmo a tristeza de ter o seu nome riscado da história para sempre. Era boa pessoa, cumpria os mandamentos, mas por priorizar o ter em detrimento do ser, provocou esse grande desastre na sua vida. No seu destino.

         O diálogo do jovem rico com Jesus é presenciado pelos discípulos. Por isso o Mestre continua explicando a eles:

         - É difícil um rico entrar no céu... é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus.

         Claro que Cristo não se posiciona contra os ricos. Isso fica claro mais adiante, quando Ele diz: “Buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas”. Coisas materiais, obviamente.

         Isso significa: se priorizarmos o Reino de Deus em qualquer circunstância, seremos abençoados também com riquezas materiais.

         Mas priorizar o reino de Deus é ir à luta nesta vida terrena, cumprindo à risca os mandamentos sagrados, o que significa trabalhar, buscar crescimento intelectual e espiritual, fazer justiça, ajudar o necessitado, fugir às tentações carnais (vícios e comportamentos nocivos à família e à sociedade).

         Priorizar o reino de Deus, portanto, nas palavras do Mestre, é lutar para vencer as barreiras do egoísmo, do comodismo, da mesmice e do conforto.

Por Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)

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