Com a morte do leão que por mais de vinte anos exercera o domínio de um vasto território, três leões jovens de imediato começam a reivindicar a sucessão do reinado.
- Eu sou o novo rei – bradam os três (às vezes ao mesmo tempo), todos caminhando entonados de um lado para outro.
Os outros animais sabem que cada um dos três tem potencial para exercer o invejado posto. Mas é preciso fazê-los entender que há apenas uma vaga, e ninguém quer derramamento de sangue.
Em assembleia, decide-se então pela realização de um concurso entre os três aspirantes ao cargo, devendo-se proclamar rei o vencedor.
A prova é simples. Basta que os três candidatos saiam correndo juntos em direção a uma grande montanha. Quem chegar primeiro ao topo será o rei.
A fiscalização fica por conta das águias, em razão de suas excepcionais habilidades de voo, visão e audição.
Chega o dia da prova. A largada é acompanhada de medonhos urros de leões e barulho ensurdecedor de torcida e vaia. Tudo ao mesmo tempo.
Mas aos poucos o barulho vai cessando, cessando, até que se instala um silêncio desanimador.
Nenhum dos três sequer chega à metade do percurso.
Nova assembleia. Há quem defenda que os três devam reinar conjuntamente. Proposta derrotada. Um novo concurso seria a solução mais plausível e justa, defende um grupo de animais depois de breve confabulação em separado.
- Esperem – grita a representante das águias. – Antes de tomar qualquer decisão, é preciso ouvir o que as águias que fiscalizaram a prova têm a dizer.
- Como não pensamos nisso antes? – replicam alguns em total acordo.
Então a águia resposável pela fiscalização do candidato número um relata:
- Eu voava a 30 centímetros acima da cabeça do leão número um quando ele caiu exausto. Seu rosto expressava revolta e frustração. Chegou a amaldiçoar o dia do seu nascimento, e disse com todas as letras que não queria mais viver, pois todos dali em diante o teriam como um derrotado.
- O número dois – explica a segunda águia – foi pior ainda, limitou-se a dizer: “Desde quando leão sobe montanha? Antes de começar a corrida eu já sabia que não venceria”.
- Nosso rei já está escolhido, é o candidato número três – avisa convicta a fiscal do terceiro leão. E aproveitando o silêncio que gerou a bombástica intervenção, continua:
- No momento exato em que o meu candidato sucumbiu ao cansaço, ele sentou-se ofegante, mas olhou firme para o topo da montanha e disse: “Eu ainda sou jovem, vou crescer e aprender muito mais. Você, montanha, já atingiu o máximo que podia, não vai mais aumentar. Além disso, eu tenho muitos sonhos, e um deles é exatamente um dia poder te vencer, subindo numa só corrida lá no alto. Um dia eu chegarei lá!”.
Terminado o emocionante relato, o terceiro leão é aclamado rei, pois sua postura diante da dificuldade revelou que é mesmo um grande líder.
Essa montanha são nossos problemas. Não sei por que (e ninguém o sabe), mas o ser humano parece ter sido projetado para lidar com problemas. Quando resolvemos um, surge outro. Sempre foi assim e sempre será. Por isso Jesus disse: “no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16.33). O que conta mesmo é ter “bom ânimo”, que significa sonhar, ter fé em Deus, desejar e buscar coisas grandiosas, ter esperança de um dia chegar a um lugar alto na vida.
Tomemos atitude semelhante à do terceiro leão. Se não conseguimos vencer nesta semana, neste mês ou neste ano, venceremos mais adiante. Os problemas podem ser uma montanha, mas serão sempre menores e mais fracos que nós, que sonhamos e temos fé em Deus.
Por Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)