Os debates sobre a necessidade de proteção da água têm-se intensificado de forma notória. Paradoxalmente, também nunca se presenciou tanto desperdício e poluição da água.
Entretanto, agora a preocupação maior nem é tanto com a possibilidade de faltar água potável no Planeta, mas com os agrotóxicos presentes na água que bebemos.
Pesquisa recente indicou a presença de seis tipos de agrotóxicos nas torneiras das casas dos moradores de Ijuí.
Agrotóxicos na água pronta para beber? Então tem algum bandido colocando veneno nas caixas d‘água? Nos canos?
Não. Ninguém fez isso.
Então estão pulverizando com agrotóxicos os rios e represas de onde pegamos água para nossas casas?
Também não.
Os agricultores estão apenas aplicando agrotóxicos em suas lavouras, que normalmente ficam bem distantes dos rios e represas. O alvo dos venenos é exclusivamente nossa comida em processo de produção nas plantações.
Ocorre que esses tais agrotóxicos são feitos da junção de moléculas, igual o que ocorre com a formação do sal, do refrigerante, de um tijolo, enfim, de todas as coisas que possam ser formadas dessas minúsculas partezinhas químicas chamadas moléculas. Visíveis ou não.
Pois bem. Quando um litro ou um quilo de agrotóxico misturado com água é aplicado na lavoura, parte do produto penetra no solo, e parte evapora. A parte que penetra na terra se mistura imediatamente com a água subterrânea; aquela que se torna gás e evapora, vai lá para as nuvens, e depois volta com a chuva. Veja-se que nos dois casos o destino do veneno é um só: a água.
Nas bulas e fichas de informação dos agrotóxicos sempre está escrito que o veneno é perigoso para o meio ambiente. Quer dizer, para o ar, o solo e a água. Para a vida, portanto, porque todos os seres vivos dependem do solo, da água e do ar.
Veja-se o que está escrito na bula do inseticida ALDRIN, encontrado na água das torneiras de várias cidades do Brasil:
“ALTAMENTE PERSISTENTE no meio ambiente.
ALTAMENTE TÓXICO para organismos aquáticos (peixes, moluscos, crustáceos, algas e milhões de outros seres).
ALTA bioconcentração em peixes.
ALTAMENTE TÓXICO para minhocas, abelhas e outros insetos benéficos.
Este produto é degradante em solo bem oxigenado e úmido.
Não utilizar este produto próximo a cursos d’água, mananciais e rios.
Não aplicar este produto com o solo úmido”.
Seguindo essas recomendações, deveria dar medo de utilizar esse veneno, de tão perigoso que é.
Agora vamos refletir sobre a tal degradação do produto. Está escrito na bula que ele degrada em solo úmido. A seguir, na mesma bula, vem a recomendação: “Não aplicar este produto com o solo úmido”.
Isso é uma clara explicação de que o destino final do veneno é sempre a água. E que a tal degradação pelo tempo não significa que o veneno vá desaparecer. Nenhum tipo de veneno desaparece.
Degradar não é deixar de existir. Nem migrar ou evaporar para outro planeta. É apenas mudar a forma da matéria. Ou às vezes apenas misturar-se ao solo, ao ar ou à água. No caso dos venenos encontrados na água potável de Ijuí, nem houve transformação; apenas misturaram-se com a água, por isso foram encontrados em sua fórmula química original de fábrica.
Para entender essas coisas não é necessário ser agrônomo, biólogo ou químico; basta ter prestado atenção nas aulas de Química dos ensinos fundamental e médio. Lá nós aprendemos uma coisa genial com um camarada chamado Antoine Laurent Lavoisier. Um professor francês que viveu no século XVIII. A chamada Lei de Conservação das Massas.
Ele descobriu que mesmo queimando, derretendo ou evaporando, a massa de um produto não desaparece do ambiente; pode sofrer transformações, mas em algum lugar irá permanecer enquanto o Planeta existir.
Foi Lavoisier quem criou a famosa frase: “Na natureza nada se cria, nada se perde; tudo se transforma”.
É exatamente o que acontece com os agrotóxicos. Eles nunca se perdem. Depois de aplicados, ou se transformam em algo ainda pior, ou se mantêm intactos na água. Para sempre.
Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)
Foto: Redes Sociais