Um certo mágico desenvolveu a habilidade de encantar tigres. Entrava na floresta e, ao avistar o primeiro tigre, começava a tocar sua flauta até hipnotizar o animal, que então seguia docilmente atrás do mágico até à cidade, o que rendia ao artista efusivos aplausos e alguns trocados que lhe garantiam a sobrevivência. O homem tinha tanta confiança em seu talento, que sequer precisava olhar para trás a fim de verificar se a fera não oferecia algum risco ou de fato o estava seguindo.
Porém um dia o show não aconteceu; o encantador foi à floresta, mas não voltou. Procura daqui, procura dali, e encontraram um tigre dormindo ao lado de ossos, pedaços de roupas e a flauta do mágico. Intrigados com o inesperado acontecimento, estudiosos capturaram o tigre para entender por que havia reagido diferente de todos os outros animais. A conclusão foi simples e indubitável: o bicho era surdo. Não ouviu o toque da flauta, por isso atacou o homem pelas costas e o devorou.
O profeta Jeremias adverte: “maldito o homem que confia no homem e aparta o seu coração do Senhor” (Jr 17.5). Por outro lado, “bendito o homem que confia no Senhor” (v. 7). O encantador de tigres depositou toda a sua confiança na capacidade artística de dominar feras, deixando de lado até mesmo o bom senso, que sempre exige um pouco de cuidado, de prudência, especialmente ao desempenhar uma atividade tão arriscada.
Certo dia assisti a uma missa na escola da minha filha Maria Letícia. Não lembro o nome do padre, que era um jovem negro, mas não esqueço o conteúdo do seu sermão dirigido a adolescentes. Depois de conquistar a plateia de forma inteligente, contou que fora atraído para o sacerdócio ainda na infância em razão de um hábito de seu pai. Todos os dias via o pai ajoelhar-se no quarto ao chegar do trabalho e orar por alguns minutos. Perguntando o porquê daquela atitude, seu pai explicou que buscava comunhão com Deus para viver feliz, e que em tudo era absolutamente dependente do Criador. A oração vespertina também tinha a finalidade de agradecer a Deus pelo dia e pedir pela noite. Contou que todas as manhãs, antes de rumar ao trabalho, enquanto o filho ainda dormia, também rezava pedindo pelo seu dia, para que tivesse paz, saúde, energia para trabalhar, e que Deus o livrasse de toda sorte de mal.
Pensou: “se esse homem forte, meu herói, chega ao ponto de ajoelhar-se para falar com Deus, e ainda diz que depende dEle, então Deus deve ser mesmo o máximo”. E assim decidiu também buscar comunhão com Deus.
Esse pai estava, com um gesto elogiável, passando uma valiosa lição ao filho. Estava ensinando o filho a aceitar a dependência de Deus e a confiar inteiramente no Senhor para ter uma vida vitoriosa, produtiva, abençoada, enfim, para tornar-se bendito, como diz o Profeta.
Um certo grau de autoconfiança é necessário e faz bem para que possamos ter atitudes positivas em circunstâncias adversas. Entretanto, por trás de cada ação que praticamos deve sempre estar a confiança em Deus. Deve estar a consciência de que dependemos do Criador para tudo, em todos os momentos da vida. Caso contrário, estaremos agindo como alguém que constrói uma casa sobre a areia, sem fundamento sólido. Essa construção pode até se manter intacta por longo tempo, mas não é segura; vindo o temporal, facilmente ruirá. Assim ocorre com aqueles que não colocam Deus na direção da sua vida, mas confiam apenas em si ou em outras pessoas. Como o mágico da nossa história, podem até experimentar o êxito, o sucesso por muito tempo, mas ao primeiro empecilho irão fracassar.

Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)